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terça-feira, 20 de setembro de 2011

Para alcançar resultados práticos, manifestantes terão de entrar no jogo político


Nesta terça-feira, será a prova de fogo das manifestações que reuniram milhares de pessoas em dezenas de cidades para protestarem contra a corrupção


No Rio de Janeiro, 594 vassouras são fixadas na praia de Copacabana, em ação contra a corrupção no país. As vassouras representam os 81 senadores e os 513 deputados brasileiros

  A partir das 17h desta terça-feira, a Cinelândia, no centro do Rio de Janeiro, volta a assumir um papel na história da política brasileira. Foi lá que, em 26 de junho de 1968, cerca de 100 mil pessoas se reuniram para protestar contra a ditadura militar, compondo o que é, ainda hoje, o maior protesto contra o regime autoritário que se instalou no país pré-AI-5. E é lá que, neste 20 de setembro, se dará a prova de fogo das manifestações que, no último dia 7, reuniram milhares de pessoas em dezenas de cidades para protestar contra a corrupção no Brasil. O evento desta noite é determinante para saber que rumos tomará esse movimento – se ele vai continuar crescendo, ou definhar.
Se o movimento progredir, logo terá de enfrentar um dilema. No feriado da Independência, os manifestantes rejeitaram qualquer ligação com partidos políticos, sindicatos e ongs, reunindo-se de maneira espontânea pelas redes sociais e deixando escancarada a perda de legitimidade daquelas organizações. Mas, para ser mais que um grito de indignação e alcançar resultados práticos, eles terão de aderir, em alguma medida, às regras do jogo político. Terão de encontrar, dentro dos partidos que hoje repudiam, quem esteja disposto a carregar sua bandeira. Ou eleger seus próprios líderes e representantes. Ou ainda, num caso extremo, dar origem a um novo partido. Esse é um dilema clássico das manifestações que nascem nas ruas.
Dizer essas coisas num momento em que as pessoas parecem ter reencontrado a voz é fazer o papel de um tio cético e rabugento. Mas, a menos que se viva em uma ditadura e o objetivo da multidão seja criar do zero uma nova ordem política, como se vê atualmente nos países árabes, esse roteiro é inescapável. Pode até ser enervante, mas essa é uma das belezas da democracia (o pior sistema de governo, à exceção de todos os outros): é por meio das instituições, como partidos, Congresso e judiciário, que as mudanças para melhor têm de ser alcançadas, mesmo que lenta e pacientemente.

“Os protestos de 7 de setembro revelam, acima de tudo, que existe uma grande desilusão com a política tradicional”, afirma o historiador Marco Antonio Villa. “Mas como mudar a realidade política, sem se fazer política? Uma coisa é criticar a estrutura existente, outra é satanizar. A questão não é dizer que ‘todos precisam sair, porque não prestam’, mas que ‘os que não prestam precisam sair’”.
No Brasil - Os mais importantes movimentos de massa da história do Brasil tiveram o amparo de partidos e políticos da oposição. O Movimento das Diretas Já, por exemplo, criado para servir de apoio ao projeto de lei do deputado Dante de Oliveira – que propunha o restabelecimento das eleições diretas para a Presidência da República –, foi abraçado por Tancredo Neves, Franco Montoro, Fernando Henrique Cardoso, Mário Covas, Luiz Inácio Lula da Silva, além de dezenas de outros protagonistas da política nacional. Mesmo com a derrota da emenda no Congresso, as Diretas foram consideradas vitoriosas por fazerem com que a população recuperasse a voz.
“Diferente do que acontece hoje, era um movimento que tinha uma proposta bem definida”, observa o cientista político Otaciano Nogueira, ao comparar as Diretas às manifestações de 7 de setembro. “Havia uma diretriz e o apoio de políticos. A automobilização é possível, mas não é duradoura. Pode até existir uma combustão espontânea, mas é necessário que algum partido levante a bandeira e a leve adiante”.
Em 1992, o amparo da União Nacional dos Estudantes (UNE), de partidos e políticos foi fundamental para o sucesso dos caras-pintadas, que levaram ao impeachment de Fernando Collor de Mello. Mesmo repudiando a partidarização do movimento, ela era inegável. As principais entidades civis do país (OAB, CNBB, UNE, UBES e centrais sindicais) deram início ao "Movimento pela Ética na Política" e o Congresso se sentiu pressionado pela opinião pública. Lindberg Farias, então presidente da UNE, foi um dos líderes do movimento – e iniciou ali uma carreira política que fez dele deputado federal pelo PT.
Também foi graças à pressão da opinião pública que os deputados brasileiros decidiram levar adiante no Congresso a votação da Lei da Ficha Limpa. Tanto políticos de partidos de oposição, como Índio da Costa (ex-DEM), quanto governistas como José Eduardo Cardoso (PT) abraçaram a ideia – o que foi fundamental para sua aprovação.
No mundo - O Tea Party, a ala ultraconservadora da direita americana, é a prova de que, mesmo nas democracias mais consolidadas do mundo, partidos e instituições enfrentam a desconfiança e a rejeição da população. Apesar do nome, o movimento não tem um partido próprio. O que seus milhares de ativistas procuram é impor uma nova agenda ao “velho e bom” Partido Republicano. Em localidades onde as lideranças republicanas tradicionais não se mostram inclinadas a adotar essa agenda, os simpatizantes do Tea Party se articulam para substitui-los por seus próprios quadros. Em outras palavras, eles não se sentem representados pelas instituições políticas, mas tentam recriar uma delas à sua imagem e semelhança.
Autor de uma série de estudos sobre a democracia, o cientista político americano Adam Przeworski revisitou, num livro recente, as opiniões de diversos autores sobre qual o papel do povo entre os períodos eleitorais. “Há quem diga que, numa democracia, as eleições são a única hora em que o povo deve se manifestar”, escreve o autor. Não é preciso ser rabugento a esse ponto. Até aquele tio cheio de ceticismo mencionado no terceiro parágrafo deste texto pode acreditar que, em certas circunstâncias, a “voz das ruas” é necessária para liberar as engrenagens políticas emperradas ou corrompidas.
Num país como o Brasil, em que a oposição encolheu numericamente e perdeu combatividade, essa voz pode ser mesmo indispensável. “A ausência de oposição é a prova de que as instituições democráticas não estão consolidadas no Brasil”, afirma Villa. “Existe uma cultura que vem da época da ditadura militar que dissemina a ideia de que ser oposição, é fazer oposição ao país”.
Usando nariz de palhaço, vestindo roupas negras ou verdes e amarelas, as multidões de descontentes desfraldaram bandeiras do Brasil e cantaram o Hino Nacional no 7 de Setembro. Os milhares de brasileiros que saíram às ruas sabiam apenas que havia chegado a hora do “basta”. As manifestações desta terça-feira mostrarão se está a caminho uma possível primavera brasileira.

Fonte: http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/as-primeiras-flores-anunciam-uma-possivel-primavera-brasileira

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Você concorda com a absolvição da Deputada Federal Jaqueline Roriz - PMN/DF, (que foi flagrada recebendo propina em 2006)

Você concorda com o Projeto de Lei 531/2011, de autoria do deputado Cristiano Araújo - PTB-DF, que propõe horários determinados para manifestações na Esplanada dos Ministérios?

Como você conheceu o @movFichaLimpa?

Qual critério tem mais peso ao escolher o candidato de sua preferência?

Mais uma polêmica envolvendo ministros. Estamos passando por uma onda de denuncismos, ou limpeza?

Você concorda com a reforma ministerial, e diminuição da quantidade de ministérios? Atualmente são 39 no total. EUA, Reino Unido, Rússia e México têm em média 20 ministérios.